Quinhentismo e Literatura de Informação
Depois de 1500 , o Brasil ficou praticamente isolado da política
colonialista portuguesa . Nenhuma riqueza se oferecia aqui às
necessidades mercantilistas da época . Só depois de 30 anos da
descoberta é que a exploração começou a ser feita de forma sistemática e
, assim mesmo , de maneira bastante lenta e gradativa .
O primeiro produto que atraiu a atenção dos portugueses para a nova
terra foi o pau-brasil , uma madeira da qual se extraia uma tinta
vermelha que tinha razoável mercado na Europa . Para sua exploração ,
não movimentaram grande volume de capital , cuidado que a monarquia
lusitana , sempre em estado de falência , precisava tomar . Nada de
vilas ou cidades , apenas algumas fortificações precárias , para
proteção da costa . Esse quadro sofreria modificações profundas ao longo
do século XVI .
Sem o estabelecimento de uma vida social mais ou menos organizada , a
vida cultural sofreria de escassez e descontinuidade . A crítica
literária costuma periodiza o início da história da literatura
brasileira com o Barroso , em 1601. Como se vê , já no século XVII .
Assim , uma pergunta se impõe : o que aconteceu no Brasil entre 1500 e
1600 , no âmbito da arte literária .
Esse período , denominado de "Quinhentismo ", apesar de não ter
apresentado nenhum estilo literário articulado e desenvolvido , mostrou
algumas manifestações que merecem consideração . Podemos destacar duas
tendências literárias dentro do Quinhentismo brasileiro : a Literatura
de Informação e a Literatura dos Jesuítas .
A LITERATURA DE INFORMAÇÃO
Durante o século XVI , sobretudo a partir da 2a. metade , as terras
então recém-descobertas despertaram muito interesse nos europeus . Entre
os comerciantes e militares , havia aqueles que vinham para conhecer e
dar notícias sobre essas novas terras , como o escrivão Pero Vaz de
Caminha , que acompanhou a expedição de Pedro Álvares Cabral , em 1500 .
Os textos produzidos eram , de modo geral , ufanistas , exagerando as
qualidades da terra , as possibilidades de negócios e a facilidade de
enriquecimento . Alguns mais realistas deixavam transparecer as enormes
dificuldades locais , como locomoção , transporte , comunicação e
orientação .
O envolvimento emocional dos autores com os aspectos sociais e humanos
da nova terra era praticamente nulo . E nem podia ser diferente , uma
vez que esses autores não tinham qualquer conhecimento sobre a cultura
dos povos silvícolas . Parece ser inclusive exagerado considerar tais
textos como produções literárias , mas a tradição crítica consagrou
assim .
Seguem alguns trechos da famosa Carta que Pero Vaz de Caminha enviou ao
Rei D. Manuel de Portugal , por ocasião da descoberta do Brasil .
"E neste dia , a hora de véspera , houvemos vista de terra , isto é
principalmente d'um grande monte , mui alto e redondo , e d'outras
serras mais baixas a sul dele de terra chã com grandes arvoredos , ao
qual monte alto o capitão pôs nome o Monte Pascoal e à Terra de Vera
Cruz .
A feição deles é serem pardos , maneira d'avermelhados , de bons narizes
, bem feitos . Andam nus , sem nenhuma cobertura , nem estimam nenhuma
cousa cobrir nem mostrar suas vergonhas . E estão acerca disso com tanta
inocência como têm em mostrar o rosto .
Os outros dois , que o capitão teve nas naus , a quem deu o que já dito é
, nunca aqui mais apareceram , de que tiro ser gente bestial e de pouco
saber e por isso assim esquivos . Eles , porém , com tudo , andam muito
bem curados e muito limpos e naquilo me aprece ainda mais que são como
aves ou alimárias monteses que lhes faz o ar melhor pena e melhor
cabelo que às mansas , porque os corpos seus são tão limpos e tão gordos
e tão formosos , que não pode mais ser . E isto me fez presumir que não
têm casas em moradas em que se acolham . E o ar , a que se criam , os
faz tais . "
A LITERATURA DOS JESUÍTAS
A título de catequizar o "gentio"e , mais tarde , a serviço da
Contra-Reforma Católica , os jesuítas logo cedo se fizeram presentes em
terras brasileiras . Marcaram essa presença não só pelo trabalho de
aculturação indígena , mas também através da produção literária ,
constituída de poesias de fundamentação religiosa , intelectualmente
despojadas , simples no vocabulário fácil e ingênuo.
Também através do teatro , catequizador e por isso mesmo pedagógico , os
jesuítas realizaram seu trabalho . As peças , escritas em medida velha ,
mesclam dogmas católicos com usos indígenas para que , gradativamente ,
verdades cristãs fossem sendo inseridas e assimiladas pelos índios . O
autor mais importante dessa atividade é o Padre José de Anchieta . Além
de autor dramático , foi também poeta e pesquisador da cultura indígena ,
chegando a escrever um dicionário da língua tupi-guarani .
Em suas peças , Anchieta explorava o tema religioso , quase sempre
opondo os demônios indígenas , que colocavam as aldeias em perigo , aos
santos católicos , que vinham salvá-las . Vejamos um trecho de uma de
suas peças mais conhecidas , o Autor de São Lourenço .
Durante o século XVI a literatura portuguesa se espelhava nos
clássicos: Virgílio, Homero; no Brasil não haviam sequer muitas pessoas
que soubessem ler. A maioria das obras escritas no Brasil na época não
foram feitas por brasileiros, mas sobre o Brasil por visitantes. Elas
são chamadas Literatura de Informação. Apenas dois autores da época
podem ser considerados autores brasileiros: Bento Teixeira, o primeiro
poeta do Brasil, e José de Anchieta, iniciador do teatro brasileiro.
Pero Vaz de Caminha
Pero Vaz de Caminha (1450?-1500) era o escrivão da esquadra de Pedro
Álvares Cabral e o autor da "certidão de nascimento" do Brasil. Em 1499
Caminha foi nomeado escrivão da feitoria que Cabral fundaria nas Índias.
Quando Cabral chegou "acidentalmente" no Brasil, foi Caminha que
escreveu ao rei de Portugal relatando a "descoberta". Do Brasil Caminha
partiu para a Índia, onde morreu no final do mesmo ano nas lutas entre
portugueses e muçulmanos. A Carta de Caminha ficou
inédita por cerca de 300 anos, mas quando foi publicada, em 1817, ajudou
a esclarecer várias questões sobre o descobrimento.
"Neste mesmo dia, a horas de véspera, houvemos vista de terra! A saber,
primeiramente de um grande monte, muito alto e redondo; e de outras
serras mais baixas ao sul dele; e de terra chã, com grandes arvoredos;
ao qual monte alto o capitão pôs o nome de O Monte Pascoal e à terra A
Terra de Vera Cruz! "
Carta de Caminha
Pero de Magalhães Gândavo
Pero de Magalhães Gândavo ( ? - 1576?) foi um cronista que escreveu dois
livros sobre o Brasil, sendo sua obra uma das melhores da Literatura de
Informação. Professor de Latim, amigo de Camões (a quem dedicou uma de
suas obras) e gramático, viveu algum tempo no Brasil e sobre o país
escreveu Tratado da Terra do Brasil e História da Província Santa Cruz. Neles descreve a Geografia e a História das capitanias que visitou.
"Quezera escrever mais miudamente das particularidades desta província
do Brasil, mas porque satisfizesse a todos com brevidade guardei-me de
ser comprido; posto que os louvores da terra pedissem outro livro mais
copioso e de maior volume, onde se compreendessem por extenso as
excelências e diversidades das cousas que ha nella pera remédio e
proveito dos homens que la forem viver."
Tratado da Terra do Brasil
História da Província Santa Cruz
Bento Teixeira
Bento Teixeira (1560-1618) escreveu a primeira obra de literatura brasileira: Prosopopeia, inspirada em Os Lusíadas,
quando tinha apenas 20 anos. Apesar de natural de Portugal, pode ser
considerado um escritor brasileiro por que se mudou para cá ainda
criança e escreveu no Brasil sobre o Brasil e para brasileiros.
José de Anchieta
O padre José de Anchieta (1534-1597) foi uma das grandes figuras do
primeiro século de história do Brasil. Nascido nas Ilhas Canárias,
domínio espanhol, tinha parentesco com Inácio de Loiola. De saúde frágil
e dedicado aos estudos, Anchieta tornou-se jesuítas aos 17 anos de
idade e naquele mesmo ano partiu para o Brasil. No Brasil Anchieta criou
o teatro brasileiro: autos para a catequese dos índios. Também fez
poesia em latim e escreveu tratados sobre o Brasil.
"Teme a Deus, juiz tremendo,
que em má hora te socorra,
em Jesus tão só vivendo,
pois deu sua vida morrendo
para que tua morte morra."
que em má hora te socorra,
em Jesus tão só vivendo,
pois deu sua vida morrendo
para que tua morte morra."
Auto de São Lourenço
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